Para além da óbvia e inegável dinâmica de parvoíce concomitante a todo e qualquer acto ventríloqua, fazem-me, hoje e sempre, confusão os bonecos. São pavorosos e deixam-nos sempre com o tal desassossego de poderem ou não ganhar vida para, manejando um ralador ou um almofariz, nos atacar num qualquer sítio pouco iluminado. Não percebo porque é que, por exemplo, não usam um anão em vez do boneco horripilante. É que é de uma parvoeira de vantagens tal que chega a ser burlesco o facto de ainda ninguém se ter lembrado disso. Logo para começar, não era preciso o ventríloquo decorar as suas falas e as do boneco. O anão decorava as suas. Os anões falam sozinhos, que eu já vi. Interagem e tudo. Os bonecos não. Depois, aquela coisa de fazer uma voz parva sem sequer abrir a boca, de certeza que não faz bem às cordas vocais dos ventriloquistas. Com o anão a falar, esta questão de saúde nunca se colocaria. Para além disso, e quiçá mais importante que tudo isso, seria uma, não digo considerável, mas no mínimo simpática contribuição para a resolução do eterno problema da empregabilidade dos anões. Sim, porque nem todos podem ser Alf’s ou robots da Guerra das Estrelas. Até o próprio mercado da pornografia com anões tem vindo a sofrer acentuada crise. Ou seja, há para aí muito anão que quer trabalhar e não consegue. Se mandassem os bonecos às urtigas, abria-se a porta para que alguns desses anões pudessem começar a endireitar as suas vidas. Era um novo mundo de oportunidades. E, pronto, não havia boneco e aquele pavor constante. Seria um dueto como qualquer outro. Sem bonecada humanóide e tão normal como uma actuação com um anão ao colo de outra pessoa consegue ser.
Olhando-se para a capa hoje aqui em exibição e científica análise, facilmente se conclui que, ao invés de aproximar o boneco de uma forma mais humana – e um anão é, em rigor, uma forma mais humana que um boneco de madeira ou esferovite –, a Geraldine decidiu antes aproximar a sua forma da do boneco. Devia-lhe dar mais jeito assim. Confesso que, a princípio, tive algumas dificuldades em perceber quem era o ventríloquo nesta capa, se é que havia algum. Não fosse o meu conhecimento académico na arte do ventriloquismo, que rapidamente me chamou a atenção para a disposição das personagens, e esta dúvida acompanhar-me-ia para sempre. Então, o Ricky, mas só porque é ele ao colo da Geraldine, é o boneco. É certo que, a julgar sobretudo pela rígida definição de todo o seu frontispício, a Geraldine terá apanhado boleia com o Ricky naquele teletransportador que "A Mosca" tornou famoso; e agora está, a bem dizer, a metamorfosear-se em algo que se destaca pela aparência pouco humana. Por outras palavras, está numa espécie de avançada, e absolutamente doentia e vomitiva, simbiose com o Ricky. Para este cenário ser ainda mais aterrador, só faltava mesmo ser de noite. Está lá o boneco psicótico que pode ganhar vida a qualquer instante. Está lá a sua maquiavélica mentora que parece, ela própria, feita de cera. Está vestida de noiva e tudo, como se impõe e é costume nestas coisas dos desequilíbrios mentais. Está lá a selva, cerrada e com plantas que têm folhas daquelas que parecem tentáculos. Rechonchudinhos, mas tentáculos. Só se safa mesmo a manta, que eu até tinha uma daquelas quando era mais rapazito e gostava bem dela. Era fofinha.
Presumo que nem deva ser preciso dizer que esta Geraldine é uma acesa devota daquelas Igrejas estranhas. Dos Cristãos Renascidos ou dos Neopentecostais. Uma dessas. Como também se depreenderá, o disco reproduz os animados diálogos entre a senhora e o seu boneco ensandecido. Quando, ao jantar, ouvirem alguém dizer “eh pá, estes muçulmanos são todos malucos” ou “com estes árabes é sempre um ver se te avias”, não se fiquem. Defendam os rapazes. Lembrem-se que, por muito desequilibrada que seja essa vadiagem que pensa que, por se detonar em tudo quando é sítio, vai sacar umas dezenas de virgens lá no céu, ainda ficam muito atrás da malta desta capa. É que, por exemplo, do 11 de Setembro, ainda me posso vir a esquecer. Duvido, mas não garanto que não me esqueça. Agora, deste “Trees Talk Too!”, aposto já peremptoriamente que não. Isto sim, é para sempre. Por último, ainda em relação a tão enigmático título, se as árvores conseguem falar, porque é que não dizem ao Ricky que não se usam calças cor-de-rosa, muito menos com uma camisola azul? Era um começo.
Outras capas:
Heino
Richard & Willie
Freddie Cage
Joyce
John Bult
said...
Não sei se já conhecias este site, mas aqui também há bons exemplares, e só de música francófona:
http://45toursnazes.free.fr/TopPochettes.htm
Rantas said...
ffidalgo said...
afinal qual é o problema da capa?
said...
Geraldine!? A mim parece-me a Priscilla Presley...
said...
o sorriso maquievélico da geraldine não egana, ela também espalha terror. é o terror na música/foto/musica-foto
said...
espero um post sobre um disco do Oscar Zamora y Don Chema...