Hoje rodopiei até ficar tonto. É, em mim, costumeira a arte de rodopiar até ficar tonto. Domino-a eximiamente e pratico-a com frequência assinalável. É uma arte que se está a inexplicavelmente a perder no turbilhão de progresso impessoal a que eles, os arteiros da maçonaria que mandam nisto tudo, nos condenaram. Já ninguém quer saber de rodopiar até ficar tonto. Os jovens não lhe pegam. Agora só querem andar na cadelice, na estragação e na gandulagem. Já que o assunto até coiso, e só assim em laivo de curiosidade e isso, é com pesar que registo ainda que um outro valoroso ofício está pelas ruas da amargura. A outrora majestosa arte de gritar números ao acaso quanto alguém está a contar alguma coisa. Claro que, quanto mais importante for a contagem, de maior importância e adequabilidade se reveste também a arte de gritar números ao calha. O que é inadmissível é que, por exemplo, eu vá registar o Euromilhões e, quando me ponho a gritar números à balda enquanto as outras pessoas preenchem os boletins, olhem para mim como se fosse algum maluquinho da cabeça. Palavra de honra que francamente. E já nem faço isto em alguns sítios. Sim, porque já se percebeu que, para a polícia, ir fazer isto para as Finanças parece que é o mesmo que andar a roubar ou a matar. E o que mais me revolta nisto tudo é que há quem insista em manter tradições medievais como o folclore ou os anões, mas depois ninguém quer saber de costumes bem mais admiráveis. Enfim, e antes que fique pior dos meus nervos, reporte-se que vejo no rodopiar até ficar tonto muito mais que uma vertiginosa experiência. Sim, é uma vertiginosa experiência, mas não é apenas e só uma vertiginosa experiência. Custa-me, dói-me o coração, que em pleno século XXI ainda exista quem ignore o potencial terapêutico do rodopiar até ficar tonto. Ou, por outra, a sua extraordinária capacidade de resolver problemas. Quanto sou confrontado com uma dificuldade, simplesmente rodopio até ficar tonto. Rodopio tanto até ficar tão tonto que, quando recupero o que quer que seja que me vai mantendo em pé no quotidiano e em comunidade durante o sábado em que me calha ir levar o lixo e ao mercado comprar película aderente ou papel de alumínio se não houver película aderente da marca que nós gostamos, o problema já se foi embora. Às vezes até já é outro dia.
said...
Eu também rodopio por birra quando vou à pastelaria e não têm um bolo que eu goste, e só têm coisas tipo "pata de cavalo" ou assim.
J. Salinas said...
O ideal é rodopiares quando já tens o bolo nas mãos e é daqueles com farinha que sai quando assopras e isso porque assim cria um efeito todo coiso.